terça-feira, 8 de outubro de 2013

Primavera Árabe deixou a mulher mais forte', diz ativista saudita

A saudita Samar Badawi (Foto: Giovana Sanchez/G1)
Samar Badawi é uma das mais importantes militantes feministas de seu país. Após sofrer abuso e ser presa por denunciar, ela passou a lutar por direitos.


No próximo dia 26 de outubro, a ativista saudita Samar Badawi, de 32 anos, vai participar de um protesto, em seu país, em que cometerá um ato considerado ultrajante, ofensivo e que pode levar à sua detenção: ela e outras mulheres vão entrar em carros e... dirigir. Sim, na Arábia Saudita, dirigir é um ato unicamente masculino - assim como quase tudo. "Estamos lutando por coisas que, para vocês [brasileiras], são mínimas. A mulher na Arábia Saudita não pode ir ao mercado, viajar, decidir com quem se casar ou estudar sem a permissão de um homem", disse ela durante um discurso em um evento corporativo em São Paulo, na noite desta segunda-feira (7).
Ao G1, Samar explicou que nos últimos dois anos algumas conquistas relevantes foram atingidas. Por exemplo, as sauditas já podem participar das Olimpíadas e votar - Samar, aliás, conta que foi a primeira mulher a processar o governo para garantir o direito ao voto. Por sua militância, no ano passado, ela ganhou o prêmio Mulheres de Coragem, dado pela secretaria de Estado dos EUA.
Mas o ativismo de Samar não veio sem sofrimento. Após ser abusada durante anos pelo pai, que ela diz ter tido 17 esposas, Samar fugiu para um abrigo e o denunciou à justiça. Acabou presa por "desobediência". Nessa época, ela já era divorciada - status difícil de se conseguir no país - e tinha um filho pequeno.
Ela ficou sete meses na prisão e foi solta graças a um advogado especializado em direitos humanos que lutou por ela - dessa história, nasceu também um romance que acabou em casamento. Hoje, o casal faz debates em sua casa, em que participam oposicionistas ao regime do reino saudita. Por isso e pelo ativismo virtual, o marido, Waleed Abu Alkhair, enfrenta acusações na Justiça e corre o risco de ser preso - ele já está proibido de deixar o país. 
Estamos lutando por coisas que, para vocês, são mínimas. A mulher na Arábia Saudita não pode ir ao mercado, viajar, decidir com quem se casar ou estudar sem a permissão de um homem" Samar Badawi
"Eu achei que só eu vivesse coisas assim, mas quando fui presa vi que havia mulheres em situações até piores, mulheres que estavam detidas havia anos, já haviam cumprido a pena, mas que não podiam sair porque não havia nenhum homem que se responsabilizasse por elas", contou Samar.
Foi o atual marido que também ensinou Samar a dirigir. Ela conta que, mesmo sendo uma prática exclusiva dos homens, ela participa dos protestos e às vezes pega o carro. "Quero mesmo chamar a atenção do governo."
Arábia Saudita ficou no topo da lista de países com menos liberdades para mulheres em um estudo do Banco Mundial divulgado neste ano. Na Constituição do país, não há leis que garantam igualdade de gênero nem nenhuma legislação que condene a violência doméstica.
Revolta árabe e a força feminina
As últimas concessões de direitos para as mulheres feitas pelo governo saudita coincidem com os protestos ocorridos nos últimos dois anos nos países vizinhos, a chamada "Primavera árabe". Samar acredita que as revoltas, que derrubaram governos no Egito, na Líbia e na Tunísia - e que tiveram como desenvolvimento uma guerra civil na Síria - tiveram influência nas reformas sauditas.

"As mulheres protestaram, isso as deixou mais fortes, mais preparadas para enfrentar os problemas com coragem e lutar pelos seus direitos", disse ela. Sobre a situação na Síria, Samar diz que fica muito chateada com o desenrolar da guerra e, principalmente, pela participação de seu país no conflito - a Arábia Saudita apoia o governo do presidente Bashar al-Assad, acusado pelo Ocidente de ter realizado ataques com armas químicas contra civis.
O futuro
Samar tem um filho de 13 anos que se questiona sobre o trabalho militante dos pais. "Meu filho me perguntou uma vez por que eu não deixo esse trabalho, já que eu posso ser presa. Eu perguntei para ele se ele acharia certo a gente limpar toda a nossa casa e deixar todo o lixo na rua. Ele disse que não, eu respondi, pois é, não adianta deixarmos tudo limpo aqui se lá fora está tudo sujo. Nos grupos de debate que fazemos em casa, ele fica na sala e ouve tudo. Tenho certeza que ele já sabe que uma mulher tem direitos e liberdades que precisam ser respeitados. Digo que ele deve agradecer a Deus por estarmos lutando para que seu futuro seja melhor."

Fonte : G1.

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